França, Suíça e Bélgica receberão a Caravana por Lula Livre Europa
São Paulo – França, Suíça e Bélgica serão os países visitados entre os próximos dias 25 e 28 pela Caravana Lula Livre Europa. A iniciativa, de comitês Lula Livre distribuídos por diversas cidades do mundo, pretende amplificar as denúncias sobre a prisão política do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, que em junho completou um ano e dois meses.
“A Caravana Lula Livre Europa tem o objetivo de fazer um movimento na França e países próximos sobre o que está acontecendo no Brasil. Ao mesmo tempo que falaremos de Lula e de sua perseguição política, abordaremos a fragilidade das instituições brasileiras”, afirma a jornalista Maria Luísa Souto Maior, uma das organizadoras do evento. “Desde 2013, o Brasil vem sendo sacudido por uma série de eventos que nos levou até a eleição de Bolsonaro. Achamos que os jornais franceses ficaram, muitas vezes, a reboque da imprensa nacional (Estadão, Globo e Folha principalmente) e não fizeram um trabalho mais elaborado para explicar ao seu leitor como funcionam as instituições brasileiras”, avalia Maria Luísa.
“Então começamos a pensar em divulgar ao cidadão francês e europeu a questão do lawfare (guerra jurídica) no caso Lula e de como o Judiciário brasileiro não é uma instituição que respeita a Constituição Federal, não está funcionando de acordo com o Estado democrático de direito”, explica a jornalista.
“Lula é corrupto ou não? Essa é a pergunta que mais nos fazem, quando sabem que somos brasileiros”, conta a jornalista que vive há 18 anos em Paris. “Por isso estamos organizando a Caravana Lula Livre Europa: para que se discuta o que e como foi criada a operação Lava Jato, seus reais interesses, com quem eles têm relação e ao mesmo tempo falar da perseguição política-jurídica que sofre o ex-presidente Lula.”
Caravana cobra respeito à justiça
As informações que vêm sendo veiculadas pelo The Intercept Brasil corroboram a importância da caravana, avalia o ex-chanceler brasileiro Celso Amorim, um dos responsáveis pela campanha Lula Livre internacional. “Até pouco tempo atrás havia muitas dúvidas na grande mídia europeia e mesmo entre personalidades sobre a questão da condenação injusta, porque há uma tendência natural, e explicável, no mundo inteiro de respeito à Justiça”, diz Amorim, lembrando que o primeiro baque real que essa visão sofreu foi o fato de o juiz que julgou e condenou ter sido nomeado ministro.
“Mas com essas revelações feitas pelo Intercept – veículo jornalístico de alta credibilidade –, não há uma peça de mídia internacional que pelo menos não coloque em dúvida, a maioria dizendo que foram cometidas injustiças, que houve uma instrumentação política da Justiça para condenar o presidente Lula”, relata o ex-ministro.
“É muito importante esse movimento de solidariedade internacional ao presidente Lula e à defesa da democracia no Brasil”, afirma Amorim, destacando que essas duas coisas caminham sempre juntas. “A libertação de Lula é uma questão de justiça, um condenado inocente que foi perseguido e agora está mais claro ainda que isso é fato. Mas também a necessidade do Brasil de manter-se no rumo do diálogo, da democracia em que o povo possa ser representando efetivamente e ter sua voz refletida na voz do presidente Lula.”
Para o ex-chanceler, tudo que está ocorrendo no Brasil, torna ainda mais urgente a libertação de Lula para que ele volte a poder participar plenamente da vida política nacional. “Só assim o Brasil pode retomar o caminho de uma verdadeira democracia e evitar muitas dessas barbaridades de absurdos que têm sido cometidos.”
Acompanhe a caravana
No dia 25, a Caravana Lula Livre Europa visita a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em Paris, para entregar um documento feito por juristas em português, espanhol, francês e inglês, com uma análise da sentença de Sergio Moro e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) nas condenações de Lula. As violações do princípio de presunção da inocência, prevista pela Constituição Federal, fazem parte desse documento que, na manhã seguinte, já em Genebra, na Suíça, será apresentado à alta comissária de Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet.
Enquanto a delegação é recebida pela ONU, nos arredores haverá uma manifestação com batucada, faixas, panfletos. “Em Genebra iremos também à Organização Internacional do Trabalho (OIT), pois Lula foi um trabalhador e sindicalista, e ao Conselho Mundial das Igrejas, visto que o ex-presidente é também um homem de fé e que deseja a conciliação. Entregaremos o mesmo documento a essas entidades”, descreve Maria Luísa.
De Genebra a caravana parte para Bruxelas, na Bélgica, para visitar o Parlamento Europeu na manhã do dia 27. Lá também será entregue o documento jurídico e haverá manifestação nas ruas. “A data de 27 de junho não é uma escolha ao acaso, é o dia de reabertura do Parlamento após as últimas eleições europeias”, relata a jornalista.
De Bruxelas a caravana parte para Estrasburgo, na fronteira entre França e Alemanha, no dia 28. Lá, o documento será entregue, ainda, à Secretaria Geral do Conselho da Europa. À tarde retornam a Paris.
Além do debate político e jurídico, a Caravana Lula Livre Europa vai contar com eventos culturais.
Para esquentar, um sarau ocorrerá no dia 19, com músicos, cantores, declamações de poesia e venda de comidas e bebidas brasileiras. Será na sede do Partido Comunista Francês, a partir das 19h.
“Uma celebração ecumênica vai reunir todas as religiões e os ateus em torno da questão dos direitos humanos, precário no Brasil e mais ainda no Brasil dessa ultradireita”, critica Maria Augusta. Será no dia 23, às 15h, na Chapelle Saint Dominique-Saint Mathieu, na capital francesa.
No dia 25, início da Caravana Lula Livre Europa, um grande teatro municipal, o Monfort de Paris, receberá o espetáculo Avril-Avril/Lettres à Lula (Abril-Abril/ Cartas à Lula), dirigido pelo dramaturgo Thomas Quillardet com o criador Calixto Neto.
“Vamos contar o ano da história do Brasil que se seguiu à prisão do ex-presidente Lula, a partir de algumas das milhares de cartas que ele recebeu”, relata a historiadora francesa Maud Chirio. “As cartas são relatos desse ano trágico, mas também histórias de vida, testemunhos de solidariedade, afeto, coragem.”
As cartas serão lidas por cerca de 40 pessoas, a maioria atores profissionais, brasileiros e franceses, mas também músicos ou figuras públicas exiladas do Brasil de Bolsonaro, como Jean Wyllys e Marcia Tiburi. “Além dessas pessoas, que lerão as cartas, o show conta com a participação de dezenas de voluntários: historiadores que contribuíram para selecionar as cartas – no âmbito do projeto Linhas de Luta – cineastas e técnicos que vão filmar, tradutores.”
Muitos artistas participarão do espetáculo, como o cantor Chico Buarque, os atores Antonio Pitanga, Camila Pitanga, Marieta Severo, Renata Sorrah, Inez Viana, os coreógrafos Volmir Cordeiro, Wagner Schwartz, a atriz, cineasta e cantora portuguesa Maria de Medeiros.
“A recepção está sendo muito boa”, conta Maud. “O teatro abre a bilheteria aos poucos, porque todos os bilhetes são reservados em poucas horas após sua disponibilização. A sala de 400 lugares já está quase lotada”, comemora.
Também há grande interessa da mídia, afirma a historiadora. “Haverá uma filmagem do canal público franco-alemão Arte, e jornalistas representando todos os principais jornais franceses estarão presentes.”
Maud ressalta, ainda, a mobilização do mundo da cultura, que pela primeira vez na Europa demonstra num grande evento que está muito preocupado com a situação no Brasil. “O desmantelamento do Estado de Direito, a prisão do Lula, os ataques contra a cultura, os intelectuais, a educação. Através dessa expressão forte e linda que são as cartas pro Lula, toda essa solidariedade está se manifestando.”
Morte de Arthur tirou da inércia
Maria Luísa Souto Maior considera que a morte do neto de Lula, Arthur, aos 7 anos de idade, em março passado, foi a propulsora desse grande movimento.
“A ideia da Caravana germinou durante um bom tempo no Comitê Lula Livre de Paris a partir de pessoas como a militante Suzete de Paiva Lima. No entanto, como é um projeto custoso e que demanda enorme organização, ia sendo protelado”, lembra. “O falecimento do netinho do presidente Lula foi o que nos fez sair da inércia e realizar essa caravana custasse o que custasse.”
A questão do financiamento é um dos principais problemas enfrentados. “Estamos nos autofinanciando e é o que dificulta a divulgação e a realização de mais eventos e a compra de material. Tivemos uma doação de mil euros da Fondation Jean Jaurès na França e a ajuda de alguns simpatizantes da caravana”, explica Maria Luísa. “Também estamos vendendo bolsas e camisetas, mas não é o suficiente para financiar um projeto dessa envergadura. Por enquanto, todos que irão, terão de pagar seu lugar no ônibus e sua estadia. O objetivo é conseguir cobrir o valor total do ônibus que ficou em quatro mil novecentos e sessenta euros. E, para isso, necessitamos urgentemente da ajuda de partidos, simpatizantes, organizações etc.”
Há um site para financiamento participativo e doações são recebidas pela conta da associação Almaa – Action dans le Monde pour l’Amérique Latine et l’Afrique (Ação Global pela América Latina e África) n° 66 143 48 P 020 – La Banque Postale RIB bancário: FR12 2004 1000 0166 1434 8P02 041).
“Estamos convencidos, há bastante tempo, que Lula foi preso exclusivamente por razões políticas. Se trata de um caso de instrumentalização do direito no contexto de uma guerra política”, avalia a professora Maud. “Uma questão muito grave que teve consequências catastróficas para o destino político do Brasil, levando a extrema direita ao poder e ameaçando de morte a Nova República.”
A historiadora ressalta, ainda, a importância de as pessoas tomarem consciência e considerar a prisão de Lula como a do líder africano Nelson Mandela acabou sendo vista nos anos 1980. “E levem a sério essa nova técnica dos ultraconservadores na escala global, que estão numa postura muito ofensiva em muitos países”, alerta.
O que move essas pessoas a, mesmo de tão longe, lutar pela liberdade de Lula? “Não conhecemos pessoalmente o presidente Lula”, relata Maria Luísa. “Uma pessoa da organização o conheceu pessoalmente em Belo Horizonte na época em que se criava o PT e, segundo ela, já era um homem carismático e educado, mas ainda longe de ser o estadista que é hoje.”
Uma carta, assinada pelos participantes da Caravana Lula Livre Europa, será enviada ao ex-presidente. “Com todo nosso carinho, agradecendo a ele por não desistir do projeto de construir uma verdadeira nação no Brasil, apesar de estar em uma situação de sofrimento. E para dizer que apoiamos sua luta por justiça, pois um país sem justiça é um país sem paz social”, diz a jornalista brasileira.