15 de maio de 2020
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Em entrevista à jornalista Candisse Matos no último sábado 8 de maio, o advogado do ex-presidente Lula da Silva, Cristiano Zanin, comentou a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que negou recurso apresentado pela defesa e manteve a condenação de Lula no caso do sítio em Atibaia.

O recurso, ou embargos de declaração, pedia uma análise, por parte do tribunal, das diversas irregularidades do caso. De acordo com Zanin, a decisão reafirma a injustiça e arbitrariedade da condenação de Lula e expõe o desrespeito ao Estado de Direito no país.

Em 2019, Lula foi condenado sob a alegação de que teria sido o beneficiário de reformas, pagas pelas empreiteiras OAS, Schahin e Odebrecht, em um sítio cuja propriedade não é sua, registrado no nome de Fernando Bittar. A acusação feita pela Lava Jato de Curitiba alegou que, em troca, Lula teria agido para favorecer essas empresas em contratos públicos, embora não tenha conseguido apontar quais foram os atos ilícitos que teriam sido cometidos pelo ex-presidente.

Além da fragilidade central do processo, a defesa de Lula apontou diversas outros vícios no recurso negado pelo TRF-4 dia 6 de maio. Dentre eles, Zanin destacou o fato do ex-presidente ter sido absolvido em outro processo bastante similar, mas que corria por fora da Lava Jato, inclusive com a anuência do Ministério Público. Também lembrou que análises periciais realizadas no sistema da Odebrecht comprovaram que o valor que acusação diz ter sido destinado à reforma em realidade foi sacado em favor de um executivo da própria empreiteira.

Durante a entrevista, Zanin ressalta que estes vícios são parte da natureza persecutória da operação. “Em relação à Lava Jato de Curitiba, não existe, de fato, uma acusação ou condenação baseadas em provas. O que existe é o uso estratégico do direito para fins de perseguição política. É aquilo que nós, há muito tempo, apresentamos como sendo o lawfare, que é esse uso estratégico do direito para perseguir e deslegitimar uma pessoa. E o caso do presidente Lula é um caso emblemático de lawfare”, afirmou o jurista.

Vaza Jato
O advogado observa que graças ao escândalo da Vaza Jato, a opinião pública gradualmente percebe as injustiças que a operação a cargo de Deltan Dallagnol, mundialmente famoso por causa do controverso powerpoint, cometeu contra Lula.

O escândalo aconteceu em junho do ano passado, quando o The Intercept Brasil publicou uma série de reportagens baseadas em vazamentos de mensagens entre o então juiz Sergio Moro e os procuradores responsáveis pela acusação contra Lula da Silva. A série despertou reação internacional ao evidenciar que Moro orientou a investigação contra o ex-presidente.

Perplexos, alguns dos principais juristas do mundo intensificaram as críticas à condução dos processos contra Lula logo após as revelações, e chegaram a lançar um manifesto denunciando a atuação de Moro, e pedindo para que o Supremo Tribunal Federal assegurasse o respeito à Constituição brasileira. “Isso mostra que efetivamente precisamos olhar esse caso do presidente Lula com muita atenção, porque ele está causando o desprestígio do sistema de justiça brasileiro no plano internacional.”

Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas
As mensagens publicadas pelo The Intercept também evidenciaram que tanto os procuradores quanto Moro trabalharam ativamente para impedir que Lula participasse das eleições presidenciais de 2018. De acordo com os vazamentos, Moro, inclusive, recebeu o convite para compor o governo de Jair Bolsonaro ainda durante a campanha eleitoral.

Na época, o Comitê de Direitos Humanos da ONU chegou a expedir decisão na qual requereu que a justiça brasileira assegurasse o exercício dos direitos civis e políticos de Lula da Silva, mas mesmo assim o ex-presidente foi impedido de se candidatar.

O órgão acompanha o desenrolar da situação de Lula desde 2016, quando a defesa do ex-presidente abriu processo junto ao Escritório do Alto Comissariado dos Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra, para que fossem analisadas violações às garantias fundamentais de Lula ocorridas durante a Lava Jato. “O Comitê constatou que, diante de todos aqueles elementos que nós já havíamos apresentado, não havia indícios de que o presidente Lula estivesse tendo direito a um julgamento justo. Por isso, foi concedida aquela liminar, que lamentavelmente foi descumprida pelo Brasil”, complementa.

Zanin informa que, assim como alguns julgamentos de recursos aqui no Brasil, o processo de Lula no Comitê de Direitos Humanos da ONU encontra-se temporariamente paralisado devido à pandemia de Covid-19.