Deputados franceses pedem a Macron que interceda no caso Lula
Um grupo de 38 parlamentares de quatro partidos franceses (LFI, PCF, LREM, PS) enviou uma carta ao atual presidente do país, Emmanuel Macron, pedindo que interfira urgentemente com todos os meios pacíficos à disposição para que Lula possa ser candidato nas eleições brasileiras, em acordo com decisão do Comitê de Direitos Humanos da ONU.
Os deputados argumentam que o Brasil vive uma grande instabilidade há dois anos e que a intervenção não seria uma intervenção sobre outro estado soberano, mas uma “busca em garantir a legalidade das eleições no direito internacional e a possibilidade de o povo brasileiro exercer plenamente sua soberania”. “Esse ato corajoso que pedimos de você estaria de acordo com a fraternidade que liga a França e o Brasil”, acrescenta o grupo.
Leia a carta na íntegra:
“Para a consideração do Senhor Emannuel Macron, presidente da República Francesa,
Caro Presidente,
Desde a destituição da presidenta do Brasil Dilma Rousseff em 2016 e a controversa chegada ao poder de seu vice-presidente Michel Temer, a situação política do Brasil é marcada pela multiplicação da prisão de personalidades políticas de destaque e a ascensão de um discurso, e às vezes de atos, de ódio antidemocrático. Neste contexto, a eleição presidencial que acontecerá dentro de algumas semanas carrega uma importância considerável para a democracia brasileira e, além, para toda a América Latina. Neste sentido, as condições sob as quais a candidatura do ex-presidente Lula, favorita das pesquisas, está neste momento rejeitada nos causam preocupação e nos levam a requerer vossa intervenção em favor de eleições justas no Brasil.
Nossa intervenção está de acordo com o apoio expressado à candidatura de Lula por seis ex-chefes de estado franceses, italianos, espanhóis e belgas, 29 parlamentares dos Estados Unidos, um antigo presidente do Parlamento Europeu, de prestigiados juristas de todas os quadros políticos e, sobretudo, do Comitê de Direitos Humanos da ONU que determinou no dia 17 de agosto que o Brasil tome todas as medidas necessárias para permitir que Lula (…) exerça seus direitos políticos divorciados da prisão, como candidato à eleição presidencial”. Este comitê é responsável pela implementação do Pacto de Direitos Civis e Políticos, texto cujo protocolo foi ratificado pelo Brasil em 2009, submetendo-se desta maneira às decisões deste comitê. Assim, sob a perspectiva do direito internacional, a decisão de barrar Lula nesta eleição é agora ilegal.
Enquanto todos os recursos apresentados por seus advogados não tiverem sido tratados pelas autoridades competentes, Lula deve poder se beneficiar das garantias constitucionais fornecidas pela legislação brasileira e ser candidato. Mais do que isso, ainda existem muitas incertezas sobre a legalidade do julgamento, o que pode colocar em questão a legalidade da disputa e provocar um impacto irremediável ao resultado. A velocidade incomum com que o processo foi conduzido leva a acreditar que essas medidas excepcionais foram implementadas com o único propósito de destituir Lula, que mostra-se imbatível nas urnas.
Antes mesmo do julgamento do Tribunal Superior Eleitoral que determinou sua inelegibilidade no dia 31 de agosto, Lula já havia sido excluído dos debates televisivos, e deliberadamente descartado da cobertura eleitoral feita pela rede Globo. Outros candidatos, entretanto, foram autorizados mesmo sentenciados recentemente. Entre eles, o representante da extrema-direita e nostálgico da ditadura militar Jair Bolsonaro, acusado pela Procuradora-Geral de racismo e por propostas discriminatórias, viu seu julgamento adiado e continua sua campanha sem qualquer impedimento. Ele pode ser o grande beneficiário da eliminação ilegal de Lula.
Em vista da instabilidade política vivenciada pelo Brasil há mais de dois anos, a possibilidade de que um extremista chegue ao comando do 5o maior país em extensão territorial e 6o em tamanho de população no mundo, sobretudo no marco de uma eleição ilegal, é particularmente preocupante. O tempo está se esgotando, restam apenas alguns dias para garantir que a eleição presidencial brasileira seja legal e legítima. É por isso que pedimos que você use urgentemente todos os meios pacíficos à sua disposição para que Lula possa ser candidato. Não haveria interferência com um Estado soberano. Pelo contrário, busca garantir a legalidade das eleições no direito internacional e a possibilidade de o povo brasileiro exercer plenamente sua soberania. Esse ato corajoso que pedimos de você estaria de acordo com a fraternidade que liga a França e o Brasil, que compartilham mais do que uma fronteira comum. O povo brasileiro se lembrará de um apoio da França que ajudaria a restaurar a possibilidade de exercer sua soberania e recolocar a história brasileira na direção do progresso.
Por favor, senhor Presidente, aceite nossas respeitosas saudações republicanas:
Clémentine Autain, Huguette Bello, Ugo Bernalicis, Moetai Brotherson, Alain Bruneel, Marie-George Buffet, Luc Carvounas, André Chassaigne, Jean-Michel Clément, Paul-André Colombani, Éric Coquerel, Alexis Corbière, Pierre Dharéville, Jean-Paul Dufrègne, Elsa Faucillon, Caroline Fiat, Régis Juanico, Sébastien Jumel, Mansour Kamardine, Manuéla Kéclard-Mondésir, Bastien Lachaud, François-Michel Lambert, Jérôme Lambert, Michel Larive, Jean-Paul Lecoq, Jean-Luc Mélenchon, Daniéle Obono, Mathilde Panot, Stéphane Peu, Loic Prud-Homme, Adrien Quatennens, Jean-Hugues Ratenon, Muriel Ressiguier, Fabien Roussel, Sabine Rubin, François Ruffin, Bénédicte Taurine, Hubert Wulfranc”
Veja a carta original: