12 de abril de 2021
O ex-presidente Lula durante entrevista coletiva em São Bernardo do Campo, em meados do mês de março de 2021. Foto: Ricardo Stuckert.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é vítima de uma perseguição que instrumentalizou a Justiça para tentar inviabilizá-lo politicamente. Já são sete anos do início deste processo que foi deflagrado pela Operação Lava Jato e que, hoje já se sabe, contou com a participação do FBI. Neste momento, Lula recuperou seus direitos, mas o risco de que seja alvo de injustiças permanece.

Por isso, é fundamental relembrar a mobilização histórica de juristas e de lideranças políticas contra práticas ilegais que colocaram em risco a credibilidade do Poder Judiciário brasileiro diante do país e da comunidade internacional.

As denúncias de que a Operação Lava Jato e o ex-juiz Sergio Moro operavam para manipular a opinião pública e o sistema jurídico como um todo foram abafadas pela maior parte dos grandes veículos de imprensa nos primeiros anos.

As Organizações Globo, muitos “jornalões” e emissoras de rádio ignoraram, por exemplo, a manifestação de 17 juristas estrangeiros que denunciaram o desrespeito ao devido processo legal e criticaram as práticas de Sergio Moro.

Apesar da postura da mídia, a importância desse documento publicado em agosto de 2019 é evidente porque durante a apresentação de seus votos no julgamento da suspeição de Moro, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski mencionaram o manifesto e seus autores.

Os 17 subescritores do manifesto são:

  • Bruce Ackerman, professor Sterling de direito e ciência política, Universidade Yale
  • John Ackerman, professor de direito e ciência política, Universidade Nacional Autônoma do México
  • Susan Rose-Ackerman, professora emérita Henry R. Luce de jurisprudência, Escola de direito da Universidade Yale
  • Alfredo Beltrán, ex-presidente da Corte Constitucional da Colômbia
  • William Bourdon, advogado inscrito na ordem de Paris
  • Pablo Cáceres, ex-presidente da Suprema Corte de Justiça da Colômbia
  • Alberto Costa, Advogado, ex-ministro da Justiça de Portugal
  • Herta Daubler-Gmelin, advogada, ex-ministra da Justiça da Alemanha
  • Luigi Ferrajoli, professor emérito de direito, Universidade Roma Tre
  • Baltasar Garzón, advogado inscrito na ordem de Madri
  • António Marinho e Pinto, advogado, antigo bastonário (presidente) da ordem dos advogados portugueses
  • Christophe Marchand, advogado inscrito na ordem de Bruxelas
  • Jean-Pierre Mignard, advogado inscrito na ordem de Paris
  • Eduardo Montealegre, ex-presidente da Corte Constitucional da Colômbia
  • Philippe Texier, ex-juiz, Conselheiro honorário da Corte de Cassação da França, ex-presidente do Conselho econômico e social das Nações Unidas
  • Diego Valadés, ex-juiz da Corte Suprema de Justiça do México, ex-procurador-Geral da República
  • Gustavo Zafra, ex-juiz ad hoc da Corte Interamericana de Direitos Humanos

O documento assinado por eles tinha como objetivo chamar os juízes do Supremo Tribunal Federal a uma reflexão “diante dos graves vícios dos processos movidos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”. Os signatários apontaram que as revelações feitas por Glenn Greenwald, do The Intercept e outros veículos de imprensa causaram estarrecimento. “As regras fundamentais do devido processo legal brasileiro foram violadas sem qualquer pudor”. O documento mencionado por dois juízes do STF apontou ainda que “num país onde a Justiça é a mesma para todos, um juiz não pode ser simultaneamente juiz e parte num processo”.

O manifesto afirma também que Sergio Moro “não só conduziu o processo de forma parcial, como comandou a acusação desde o início”, que ele manipulou mecanismos da delação premiada e grampeou os advogados de Lula. Diante dos fatos apontados, os juristas afirmam que “Lula não teve direito a julgamento imparcial” e que é indispensável que os juízes do STF sejam os garantidores do respeito à Constituição. Por fim, o manifesto conclui que a Justiça foi instrumentalizada para fins políticos e o Estado de Direito foi claramente desrespeitado. “Não há Estado de Direito sem o devido respeito ao processo legal”.

Parte dos autores e alguns outros nomes já haviam se manifestado em agosto de 2018 quando dez juristas e advogados europeus e latino-americanos enviaram cartas para a então presidenta do STF, Cármen Lúcia, e para o presidente da República, Michel Temer, demonstrando preocupação com as irregularidades no processo que conduziu Lula à prisão.

Os signatários criticaram a divulgação da conversa entre Dilma Rousseff e Lula que fora interceptada ilegalmente e destacaram as “condições criticáveis” pelas quais foi anulada a decisão do desembargador Rogério Favreto para libertar o ex-presidente e “o caráter parcial do processo que levou à prisão de Lula”. Assinaram o documento dez juristas, entre eles: Baltasar Garzón, da Espanha; Luigi Ferrajoli, da Itália e William Bourdon, da França. A carta também é assinada por outros nomes, como o jurista Emílio García Mendez, presidente da Fundação Sul-Argentina, e o presidente de honra da Liga de Direitos Humanos (LDH), Henri Leclerc.

A perseguição ao ex-presidente Lula, obviamente, também gerou um intenso debate entre juristas brasileiros. Discussão que também foi ignorada pela maior parte da imprensa brasileira, principalmente, pelos veículos que se propuseram a ser os maiores porta-vozes da Lava Jato.

Em junho de 2018, 270 advogados brasileiros publicaram um manifesto contra o arquivamento do pedido de liberdade do ex-presidente Lula e apontavam que o debate era profundo, sobre o Direito brasileiro: “Trata-se de a Suprema Corte dizer sim ou não a uma garantia constitucional de liberdade prevista na Constituição como cláusula pétrea”. Esses especialistas continuam empenhados na defesa do devido processo legal e da Constituição brasileira publicando artigos em jornais ao longo dos últimos anos e apresentando suas perspectivas em entrevistas. Basta consultar os veículos de comunicação, sites especializados ou a página do grupo Prerrogativas que lançou dois livros que abordam a questão: “O livro das suspeições” e “O livro das parcialidades”.

Outros documentos históricos assinados por lideranças do mundo inteiro são o manifesto “Eleição sem Lula é fraude” de 2018 e o Manifesto de Solidariedade Internacional ao presidente Lula pela anulação das sentenças do STF que foi publicado em novembro de 2020.

As injustiças contra Lula foram denunciadas por personalidades laureadas com o prêmio Nobel, por ex-presidentes de diferentes países, ex-chanceleres e intelectuais do mundo inteiro como Noam Chomsky, David Harvey, Boaventura de Sousa Santos, Chantal Mouffe e muitos outros.

Se a Constituição brasileira não for garantida, o Estado de Direito pode sofrer mais um golpe e o desrespeito ao devido processo legal poderá ser normalizado. Algo que seria uma tragédia para um país onde as inúmeras injustiças já são flagrantes.

Os manifestos mencionados estão disponíveis aqui, aqui e aqui.